terça-feira, 25 de junho de 2013

A "energia política" dos protestos: coerências e incoerências

Por Anderson Araújo
No país do futebol, o brasileiro deixa o campo e vai às ruas! As manifestações começaram com o objetivo de reduzir a tarifa do transporte coletivo. Objetivo legítimo, manifesto pacífico também legítimo e, para nossa surpresa, objetivo alcançado! Está aí, exercício da democracia; se nossos representantes não nos representam, protestamos!

Entretanto, é hora de parar e pensar. É o momento de avaliar, analisar e decidir se estas manifestações devem continuar. Sim, a demanda é enorme: hospitais, saúde, melhoria do transporte público, a CORRUPÇÃO. Parece-me que as manifestações perderam o foco, viraram modismo, e o pior, deram espaço para oportunistas, pessoas que não lutam pelo país, mas tão somente pela sua carreira... política! Prova disso é o fato de tomarem um partido ou cargo político, mais especificamente, a presidenta da república como "bode expiatório". 

Um povo carente e cansado de ser enganado, continua sendo manipulado! A rima se justifica por alguns motivos: 

1) As manifestações começaram com um objetivo específico que foi alcançado. 
2) O ano de 2014 é um ano de eleições no Brasil, e não apenas de Copa do Mundo.
3) O brasileiro participa, de certo modo, do que em sociologia chamamos de mobilidade social, que seria a mudança de posição social do cidadão, ou pelo menos, o acesso a bens e serviços de qualidade que até então somente uma determinada classe de pessoas tinha.
4) A quem interessa a mobilidade social?
5) A quem não interessa a mobilidade social?
6) O governo federal criou novas universidades e aumentou consideravelmente o número de vagas nas universidades.
7) Facilitou o acesso do estudante de escola pública às universidades federais e particulares.
8) O governo federal anunciou que o pré-sal é do Brasil e que todo o dinheiro do pré-sal é para o brasileiro! (Nota-se que não se fala em privatização, ou permissão aos Estados Unidos da América para explorar o que é do brasileiro). Ah, fala-se em investir 100% dos royalties do petróleo na EDUCAÇÃO. 
9) A quem interessa ter todo este investimento na EDUCAÇÃO?
10) A quem NÃO interessa ter todo este investimento na EDUCAÇÃO?
11) As manifestações perderam o foco, os protestos são contra tudo!
12) As manifestações se intitulam apartidárias, sem influências de partidos. Você acredita nisso?

Entendo que todos os motivos supracitados merecem maiores esclarecimentos. Será que os protestos continuam coerentes? Nota-se que em nome da democracia, alguns grupos se tornam até antidemocráticos  ao pedirem o fim de partidos. Se não há partidos, há o quê? Ditadura! Há partidos porque há liberdade, liberdade para gostar de azul ou de branco, para apoiar o verde ou o vermelho, porque temos o direito de escolhermos quem vai nos representar.

As manifestações pacíficas conseguiram provocar a presidenta que prometeu não medir esforços para fazer o possível como presidenta para atender as solicitações das manifestações. Independentemente de partido político, somente o (a) Presidente da República não vai resolver o problema de todos os municípios, de todos os brasileiros. O Aécio não resolveria, Fernando Henrique Cardoso também não,  nem o Obama.

Não queremos a ditadura. Se você for às ruas para protestar, "investigue", se "informe" a respeito das pessoas que estão organizando o protesto. Veja se há um objetivo específico. As demandas são muitas, mas não resolveremos todos os problemas do país em algumas semanas de protestos. Alguns problemas são locais e os seus vereadores devem responder por isso, vá até eles. Assista às plenárias, as reuniões dos vereadores, dos deputados, investigue, proteste junto a eles no cotidiano. Estude. Leia. Pergunte. 

E o mais importante: não lute contra você mesmo nas ruas. Não lute contra os seus direitos. Não utilize a violência. Não negue a sua identidade. Vamos protestar, mas com consciência, sem ser usado por pessoas que sempre estiveram no poder, que sempre usufruíram dos benefícios do poder e hoje se incomodam com a mobilidade social, que hoje se incomodam ao verem o acesso do pobre às universidades federais, aos aeroportos, à cultura e a bens e a serviços que antes era restrito a um grupo "seleto" de pessoas. É fato que demandas consideradas essenciais ainda não são atendidas, como as da saúde. Mas o governo já foi "provocado" e passa a agir em caráter emergencial para resolver estas demandas.

Vamos aproveitar esta "energia política" para analisarmos, estudarmos, para continuarmos no exercício da democracia mais conscientemente, sobretudo através do voto. Aprendemos que o protesto pode nos garantir alguns direitos.  Mas não o protesto contra tudo e contra todos. Aprendemos que protestar contra tudo é o mesmo que protestar contra nada. Certamente, nossos direitos serão mais respeitados quando aprendermos a votar. Seguir a moda, simplesmente para "estar na moda" é o que o poeta Carlos Drummond dizia "é duro estar na moda, ainda que a moda seja negar minha identidade" e pior, você acaba sendo marionete nas mãos de uma "marca", quer dizer, de um "partido".

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Protestos no Brasil, o "início de alguma coisa"

Por Anderson Araújo

Há cerca de 15 dias escrevi o texto "imaginações constrangedoras". Naquele texto, quis desabafar a minha angústia de assistir a uma realidade, no mínimo 'estranha', uma "Copa padrão FIFA" num país rico, com hospitais e escolas de padrão MISERÁVEL. De fato me sentia constrangido por não encontrar motivos para participar da "festa", quer dizer, da Copa das Confederações. No texto eu ainda destacava o "lado" positivo desta "festa": despertar o brasileiro, mostrar ao brasileiro que não somos pobres, mas mal representados!

Percebo com alegria que algumas das minhas imaginações deixaram de ser constrangedoras e tomaram as ruas através de cartazes, vozes, músicas e pés de milhares de brasileiros. Percebo com alegria que o brasileiro não se sentiu nem um pouco constrangido em ir às ruas e passar horas fora de casa, longe do facebook e do twitter, 'somente' para PROTESTAR! 

"Saímos do facebook" - são os dizeres de milhares de brasileiros, reproduzidos em cartazes e na pele dos filhos do Brasil que não fogem à luta! Por que fomos para as ruas? Porque cansamos de "assistir" a toda hipocrisia quase legalizada pelos nossos representantes políticos! Porque notamos que, se podemos construir estádios maravilhosos, também podemos construir escolas e hospitais. Porque percebemos que se podemos sediar uma Copa, também podemos melhorar o transporte público. Porque aprendemos com estádios "padrão FIFA" que o problema do Brasil não é falta de dinheiro!

"Saímos do twitter" porque nos engasgamos com uma Copa rica, entretanto doente e sem educação. Nossos olhares se deslumbraram com a beleza dos estádios, mas choraram com o descaso histórico dos representantes políticos com o brasileiro cansado de pagar impostos. 

Fomos às ruas porque não nos sentimos REPRESENTADOS, nem pelo partido X, nem pelo Y. Estamos nas ruas porque queremos realmente viver num país democrático, onde a voz da maioria seja ouvida, onde a  necessidade da maioria seja respeitada. Protestamos porque já não toleramos mais a impunidade, já não suportamos mais o "jeitinho brasileiro" comumente praticado pelos nossos políticos. Queremos divulgar para o mundo o "jeitão brasileiro": nossa arte, nossa natureza e nosso trabalho com honestidade e transparência! 

As ruas de todo o Brasil demonstraram nos últimos dias que necessitamos de muita coisa; que muitos ainda não sabem exatamente o que precisam, mas têm certeza de que "precisam", de que lhes faltam algo, e principalmente, merecem algo melhor do nosso país! Todos temos a certeza de que não queremos pessoas que legislem em benefício próprio! Os estádios "exalaram" um odor desagradável, provocando enjoos e vômitos pelas ruas do Brasil...

Não sabemos o que tudo isso provocará no futuro do nosso país, e qual a verdadeira dimensão desses manifestos, mas parafraseando o filósofo Deleuze, eu diria que o que conta é que estamos no início de alguma coisa!

(Fernando Birri citado por Eduardo Galeano)

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Imaginações Constrangedoras

Por Anderson Araújo
(Para Guilherme Colombini  e Wanessa Lima)
Há meses pretendo escrever sobre o que penso em relação ao Brasil nas vésperas da Copa das Confederações, sobre este Brasil que se prepara para sediar uma Copa do Mundo. Não gostaria de ser desagradável, pessimista, alguém que não consegue perceber "o lado bom" das coisas. Sempre tento dar um novo significado às coisas que me aparecem como "feias", "tristes", "negativas", postura que aprendi lendo o filósofo Nietzsche.

Todo mundo já deve ter pronunciado a frase "imagina na Copa?" alguma vez nos últimos meses. Principalmente em conversas sobre trânsito, filas, comércio, hospedagens, e agora sobre os estádios, quer dizer, ARENAS "padrão FIFA". 

Perdoem-me, mas quem não se "impactou" ou não se sentiu "incomodado" com o valor gasto nas obras dos estádios, não tem consciência de como vivem ou sobrevivem milhões de brasileiros. Dinheiro público investido em "arenas". Sim, há melhorias que veremos a médio ou longo prazo, como algumas modificações no trânsito, implantação de "BRT" etc, mas pouco significativas diante da carência do povo brasileiro. 

Continuo tentando ver o "lado bom", porém, até as entrevistas do técnico da Seleção Brasileira de Futebol, desde o anúncio da sua contratação conseguiram "atrapalhar" ainda mais a "festa", mostrando-se sempre mal-educado, ensinando com isso que um técnico, um chefe, um líder autoritário, não pode ser questionado, não aceita opiniões e que, independentemente dos resultados, vai se manter no "cargo". 

As propagandas tentam constranger todos os críticos desse evento que o Brasil vai sediar. Elas sugerem que pessoas que perguntam "imagina na Copa?" são pessimistas, "gente" que não gosta de festa. 

Imagina a festa dos grandes empresários, dos nossos representantes políticos e das empresas que financiam o espetáculo; imagina a festa das empresas que já administram estádios "padrão FIFA" reformados e construídos com dinheiro público... 

Que festa vai fazer o trabalhador que, após um longo dia de trabalho, continuará enfrentando um trânsito desumano na volta para casa? A verdadeira questão deveria ser: "Quem terá condições de participar dessa 'festa' que vem sendo planejada com tanto empenho pelos nossos representantes políticos e pelas empresas?"

Nesta minha tentativa de abordar o assunto sem ser constrangido pelas propagandas que me impedem de ser pessimista em relação à "festa", consegui dar um novo significado e ver o "lado bom" desse evento. Notei que todas os preparativos para a "festa", inauguração de estádios, e obras que se estenderão até 2014, servem para "impactar", ou em outras palavras, "acordar" todos aqueles que ainda não perceberam a capacidade que o Brasil tem de ser um país melhor. Indiscutivelmente o Brasil tem muita gente com disposição para trabalhar, construir, ajudar, e de melhorar a situação do seu próprio país e tem hoje, ao contrário de muitos países que vivem uma enorme crise financeira, dinheiro e investimento de grandes empresas!

Imagina se os nossos governantes se esforçassem para reformar e construir, creches, escolas e hospitais? Imagina a festa!

Imagina se fossem criadas várias equipes e comissões para investigarem efetivamente o funcionamento das nossas escolas e dos nossos hospitais? Imagina a festa!

Imagina se o Estado fizesse uma parceria com as empresas para construir escolas e hospitais? Imagina a festa!

Imagina se nós, brasileiros, tivéssemos realmente um espírito nacionalista e fizéssemos reivindicações pela saúde e pela educação aos representantes que elegemos? Imagina a festa!

Imagina se nós tivéssemos tanto interesse pelo desempenho dos nossos representantes políticos igual ao que temos pelo desempenho da Seleção Brasileira de Futebol? Imagina a festa!

Imagina se milhares de brasileiros deixassem de sofrer e de morrer nas filas de hospitais? Imagina a festa!

Imagina se você tivesse uma escola pública de qualidade que lhe capacitasse para entrar numa Universidade Federal sem ser necessária uma política de cotas? Imagina a festa!

Imagina se os impostos que o brasileiro paga todos os dias se transformassem em serviços gratuitos de qualidade para o brasileiro? Imagina a festa!

Constrangimento é imaginar que só poderemos fazer a festa no período da Copa do Mundo!